A teoria de Freinet pode ser denominada de método natural, pedagogia do bom senso e educação pelo trabalho. De qualquer maneira, o que todos esses nomes procuram demonstrar é a compreensão de que, para Freinet, o trabalho funciona como ferramenta educativa, bem como a Educação age como ferramenta para o trabalho. Além disso, devemos lembrar ainda que a pedagogia de Freinet se desenvolve a partir da idéia de que, para educar, devemos levar em consideração as ações do homem em sua vida cotidiana.
Como vimos no tópico anterior, Freinet preocupava-se com as desigualdades sociais e o domínio de uma classe sobre outra(s), e direcionou seu trabalho às crianças filhas das classes operárias.
Ao iniciar seus trabalhos com as crianças “operárias”, Freinet observou que aquelas que eram vistas como ativas, felizes ou mesmo agitadas fora da sala de aula, quando estavam dentro da sala de aula comportavam-se de maneira apática, demonstrando total desinteresse pelo processo educativo. Foram essas observações que levaram Freinet a desenvolver uma teoria pedagógica preocupada em ligar a escola e a vida cotidiana meio do contato (experimentação) da natureza e do contato com o meio social e cultural dos alunos.
A experimentação, fundamento básico do método natural, aponta para o aprendizado como algo que ocorre por processos de repetições de ações bem sucedidas no meio onde os alunos estão integrados. Essas repetições e integrações, entendidas como processos, devem ser pensadas dentro das possibilidades de aprendizagem de cada educando. Isso significa dizer que Freinet considera que parte do aprendizado ocorre por meio do “tateamento” experimental, a manipulação do real pelo aprendiz, o que produz, segundo Minicucci (1992, p. 48), novas descobertas, desequilíbrios e adaptações.
Assim, ao observar a vida cotidiana das crianças nas escolas, Freinet percebeu o grande interesse delas pelo mundo extra-escolar, e que a melhor maneira de favorecer o conhecimento das crianças sobre esse mundo até então desconhecido por elas era por meio da experimentação ativa, da manipulação.
Desse modo, o conhecimento ou aprendizagem, na teoria de Freinet, se faz em vários sentidos. O primeiro está colocado na relação do homem com seu meio, uma vez que é nessa interação que o homem extrai conhecimentos históricos e sociais que o ajudam a compreender a si e ao meio que o cerca. O segundo sentido está colocado na via da experimentação concreta, na qual o aluno constrói seu conhecimento de forma livre e espontânea. O terceiro caminho é o que se faz pela via do trabalho, por meio de técnicas que auxiliam as crianças a ir da ação à reflexão e da reflexão de volta à ação. As técnicas naturais aparecem, nesse contexto, como uma maneira de permitir à criança aprofundar seus conhecimentos de forma prática.
Pelo caráter social de sua teoria, Freinet se colocou contrário aos grandes manuais de instrução pedagógica, criando, junto com seus alunos, diferentes materiais pedagógicos que permitiam explorar a vida de maneira ativa, construindo conhecimentos sobre o mundo e sua existência.
A seguir citamos algumas das atividades naturais desenvolvidas por Freinet.
O livro da vida – material que tem como objetivo o registro das experiências das crianças sobre os conteúdos e conceitos aprendidos nas diferentes disciplinas. A partir desse material, as crianças podem discutir seus dilemas de aprendizagem de maneira ativa e contextualizada.
Intercâmbio interescolar – técnica simples que consiste na troca de correspondências entre alunos de diferentes escolas e regiões. A intenção é levar os alunos a conhecerem outras realidades sociais e culturas diferentes das suas.
Fichas de estudo – consistem em fichas de auto-avaliação organizadas por temas em fichários, criadas para desenvolver nos alunos o sentido da avaliação.
Aulas passeio – consistem em atividades externas à escola, como passeios a bibliotecas, zoológicos, parques, entre outros, que têm como finalidade levar os alunos a interagir concretamente com os conceitos apresentados em sala de aula.
Célestin Freinet e o método natural
A imprensa escolar – se desenvolveu a partir da experiência do intercâmbio interescolar, que por ganhar grandes dimensões acabou por promover o surgimento da imprensa escolar. Esta última consiste na divulgação das “notícias” reunidas pelos alunos a partir da troca de cartas entre eles. É o que hoje chamaríamos de “jornal escolar”.
Por meio da imprensa escolar, os alunos elaboravam jornais cuja leitura era compartilhada por amigos e familiares. A correspondência interescolar abriu ainda mais essas fronteiras. Os alunos enviavam fotos, desenhos, cartas, jornais para colegas distantes. Foi assim que as crianças da montanha passaram a conhecer o mar, a pesca e os costumes de comunidades que viviam em aldeias marítimas. E estes ficavam sabendo das colheitas, da vida dos pastores, dos tecelões, das histórias das comunidades do interior.
Texto livre – essa atividade é voltada para o desenvolvimento das habilidades lingüísticas, criativas, reflexivas, afetivas e lógicas dos alunos, pois se refere ao desenvolvimento de um texto (redação) a partir de um tema livre, por meio do qual o aluno pode expressar o que quiser.
A livre expressão pode ser desenvolvida, segundo Freinet, não só em textos, mas também em atividades artísticas como as que seus alunos desenvolviam em ateliês de arte, o que pode ser feito em atividades de fala, escrita, dança, pintura, expressão corporal, dramatização, entre outros.
Plano de trabalho – atividade que tem como proposta auxiliar os alunos a organizarem os conteúdos curriculares e as estratégias de aprendizagem a serem utilizadas por eles durante as aulas e na execução de seus trabalhos semanais. Tal atividade deve ser feita, preferencialmente, em cooperação.
Correspondência intraescolar – atividade similar ao intercâmbio interescolar, mas que é realizada no interior da própria escola pela correspondência entre crianças de classes e séries diferentes. As informações entre os alunos podem ser trocadas por meio de cartazes, cartas, bilhetes, cds, emails, vídeos, textos, entre outros.
A Educação pelo trabalho
Falar de Educação pelo trabalho significa falar da Educação por meio da experiência concreta, como já vimos, e isso era realizado por Freinet com atividades de trabalho pedagógico ou mesmo de trabalho real, a partir de iniciativas politécnicas, como no caso da experiência com alunos na utilização de impressoras, teares, ateliês de artes, hortas, atividades agrícolas, de marcenaria, de jardinagem, entre outras.
O trabalho, na pedagogia de Freinet, é entendido como um princípio educativo, na qual os alunos aprendem de forma lúdica, cooperativa/coletiva a pensar e atuar em prol do bem comum, como no caso do cuidado com as hortas, por exemplo. Desse modo, nos diz Freinet que devemos aproveitar as características infantis como a capacidade de criação, a curiosidade e a vontade de agir para satisfazer uma outra necessidade da criança, a do trabalho, que, segundo ele, desenvolve-se em todas as crianças.
A avaliação na pedagogia de Freinet
Tomando como ponto de partida as atividades de avaliação propostas por Freinet, a saber, as fichas de estudo e os planos de trabalho, podemos afirmar que a avaliação na teoria de Freinet baseia-se em princípios hoje denominados de avaliação em processo ou avaliação processual.
Freinet costumava também se reunir com seus alunos, pelo menos uma vez por semana, para discutir com eles os conteúdos estudados e as construções de cada aluno sobre os conhecimentos apresentados, ou seja, suas dificuldades e articulações de conhecimentos.
Texto:
Valéria da Hora Bessa
Fragmento
do Livro: Teorias da Aprendizagem
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