domingo, 3 de maio de 2015

Teorias da Aprendizagem XXVIII – Tipos de inteligência



No interior de sua teoria, Howard Gardner apresenta sete tipos distintos de inteligência, que serão apresentados a seguir.

Inteligência linguística

Nas lutas de um poeta com o fraseado de um verso ou de uma estrofe, vê-se em funcionamento alguns aspectos centrais da inteligência linguística. O poeta deve ser superlativamente sensível às nuances dos significados das palavras. Em vez de cortar conotações, ele deve tentar preservar os sentidos buscados o quanto for possível. Além disso, os significados das palavras não podem ser considerados em isolamento. Já que cada palavra avalia suas próprias penumbras de significado, o poeta deve certificar-se de que os sentidos de uma palavra numa linha do poema não colidam com os levantados pela ocorrência de uma segunda palavra em outra linha. As palavras devem captar com o máximo de fidelidade possível as emoções ou imagens que animaram o desejo inicial de compor.

Ao discutirmos os significados ou conotações de palavras, nos encontramos na semântica, aquele exame do sentido que é universalmente considerado central à linguagem.

Mas outros domínios de linguagem também são de singular importância para esse poeta. O poeta deve ter sensibilidade aguçada à fonologia: os sons das palavras e suas interações musicais; ainda o domínio da sintaxe; as regras que governam a ordenação das palavras e suas inflexões, que é outro sine qua non da poesia. O poeta deve entender, intuitivamente, as regras da construção das frases, bem como as ocasiões nas quais é permissível burlar a sintaxe, justapor palavras que, segundo princípios gramaticais comuns, não deveriam ocorrer juntas.

Mas para aqueles que não são poetas praticantes, quais seriam os outros principais usos aos quais a linguagem pode ser colocada? Primeiro há o aspecto retórico da linguagem – a capacidade de usá-la para convencer outros indivíduos a respeito de um curso de ação.

Em segundo lugar, há o potencial mnemônico da linguagem – a capacidade de usar essa ferramenta para ajudar a lembrar das informações variando de listas de posses às regras de um jogo, de instruções para orientar-se até procedimentos para operar uma nova máquina. E um terceiro aspecto da linguagem é o seu papel na explicação.

Grande parte do ensino e aprendizagem ocorre por meio da linguagem. Finalmente, há o potencial da linguagem para explicar suas próprias atividades – a capacidade de usá-la para refletir sobre ela mesma, fazer análise metalinguística.

Inteligência musical

Os componentes centrais da inteligência musical são o tom (melodia) e o ritmo (sons emitidos em determinadas frequências auditivas e agrupados conforme um sistema prescrito). O tom é mais central em determinadas culturas – por exemplo, o rítmico é correlativamente enfatizado na África do Sul, onde as proporções rítmicas podem atingir uma complexidade métrica vertiginosa. Parte da organização da música é horizontal – as relações entre os tons quando se desenrolam no tempo –, e parte é vertical: os efeitos produzidos quando dois sons são emitidos ao mesmo tempo, dando surgimento a um harmônico ou dissonante.

Muitos especialistas foram adiante, colocando os aspectos afetivos da música perto do seu centro. Ao longo dos séculos, tentativas de associar música com matemática parecem um esforço conjunto para ressaltar a racionalidade da música. No entanto, dificilmente alguém que esteve intimamente associado à música pode abster-se de mencionar sua implicações emocionais.

Inteligência lógico-matemática

Essa forma de pensamento pode ser traçada de um confronto com o mundo dos objetos. Pois é confrontando objetos, ordenando-os, reordenando-os e avaliando sua quantidade que a criança pequena adquire seu conhecimento inicial e mais fundamental sobre o domínio lógico-matemático.

Deste ponto de vista preliminar, a inteligência lógico-matemática rapidamente torna-se distante do mundo dos objetos materiais. O indivíduo torna-se mais capaz de apreciar as ações que pode desempenhar sobre objetos, as reações que prevalecem entre essas ações, as afirmativas que pode fazer sobre as ações reais ou potenciais e os relacionamentos entre essas afirmativas. Ao longo do curso do desenvolvimento, prossegue-se de objetos para afirmativas, de ações para relações entre as ações, do domínio da pura abstração – enfim, os ápices da lógica e da ciência. As raízes das regiões mais elevadas do pensamento lógico, matemático e científico podem ser encontradas nas ações simples de crianças pequenas sobre os objetos físicos de seu mundo.

No que tange à gênese e ao desenvolvimento do ensinamento lógico-matemático, a pesquisa de Piaget é preeminente. Ele astutamente discerniu as origens da inteligência lógico-matemática nas ações da criança sobre o mundo físico; a importância crucial da descoberta dos números; a transição gradual da manipulação física dos objetos para transformações interiorizadas de ações; os significados das relações entre as próprias ações; e a natureza especial das camadas mais elevadas do desenvolvimento, em que o indivíduo começa a trabalhar com afirmativas hipotéticas e a explorar os relacionamentos e implicações que prevalecem entre elas.

Inteligência espacial

Centrais à inteligência espacial estão as capacidades de perceber o mundo visual com precisão, efetuar transformações e modificações sobre as percepções iniciais e ser capaz de recriar aspectos da experiência visual, mesmo na ausência de estímulos físicos relevantes. Pode-se ser solicitado a produzir formas ou simplesmente manipular as que foram fornecidas. Essas capacidades são claramente não-idênticas: um indivíduo pode ser arguto em percepção visual, embora tenha pouca capacidade para desenhar, imaginar ou transformar um mundo ausente.

A operação mais elementar sobre a qual outros aspectos da inteligência espacial se baseiam é a capacidade de perceber uma forma ou um objeto. Uma vez que somos solicitados a manipular a forma ou o objeto apreciando como ele será apreendido de um outro ângulo de visão ou como pareceria se fosse girado, entramos completamente na esfera espacial, pois uma manipulação no espaço foi necessária. Problemas de dificuldade ainda maior podem ser propostos no domínio “objeto” ou “figura”. De fato, problemas no ramo matemático da topologia requerem precisamente a capacidade de manipular formas complexas em várias dimensões.

A inteligência espacial acarreta algumas capacidades: a de reconhecer exemplos do mesmo elemento; a de transformar ou reconhecer uma transformação de um elemento em outro; a de evocar formas mentais para então transformá-las; a capacidade de produzir uma representação gráfica de informações espaciais, e similares.

Inteligência corporal cinestésica

Característica dessa inteligência é a capacidade de usar o próprio corpo de maneiras altamente diferenciadas e hábeis para propósitos expressivos, assim como voltados a objetos. Igualmente característica é a capacidade de trabalhar habilmente com objetos, tanto os que envolvem movimentos motores finos dos dedos quanto os que exploram movimentos motores grosseiros do corpo. Controlar os movimentos do próprio corpo e a capacidade de manusear objetos com habilidade são os centros da inteligência corporal.

Uma descrição do uso do corpo como uma forma de inteligência pode, a princípio, chocar. Houve uma separação radical em nossa tradição cultural recente entre as atividades do raciocínio, por um lado, e as atividades da parte manifestamente física da nossa natureza, conforme epitomada por nossos corpos, do outro. Esse “divórcio” entre o mental e o físico não raro esteve aliado à noção de que o que fazemos com nosso corpo é um tanto menos privilegiado, menos especial do que as rotinas de resolução de problemas desempenhadas principalmente pelo uso da linguagem, da lógica ou de algum sistema simbólico relativamente abstrato.

Vale destacar, no entanto, que nos últimos anos psicólogos discerniram e enfatizaram uma íntima relação entre o uso do corpo e o desenvolvimento de outros poderes cognitivos.

Inteligência interpessoal

Essa inteligência engloba os dois aspectos da natureza humana. De um lado há o desenvolvimento dos aspectos internos de uma pessoa. A capacidade central em funcionamento aqui é o acesso à nossa própria vida sentimental – nossa gama de afetos e emoções: a capacidade de efetuar instantaneamente discriminação entre eles, sentimentos e, enfim, rotulá-los, envolvê-los em códigos simbólicos, basear-se neles como um meio de entender e orientar nosso comportamento. 

Em sua forma mais primitiva, a inteligência intrapessoal equivale a pouco mais do que a capacidade de distinguir um sentimento de prazer e um de dor e, com base nessa discriminação, tornar-se mais envolvido ou retrair-se de uma situação. Em seu nível mais avançado, o conhecimento intrapessoal permite que detectemos e simbolizemos o conjunto de sentimentos altamente complexos e diferenciados.

Inteligência intrapessoal

A outra inteligência pessoal volta-se para fora, para os outros indivíduos. A capacidade central aqui é a de observar e fazer distinções entre outros indivíduos e, em particular, entre seus humores, temperamentos, motivações e intenções. Examinada em sua forma mais elementar, a inteligência intrapessoal acarreta à capacidade da criança pequena de discriminar entre os indivíduos ao seu redor e detectar vários humores. Numa forma avançada, o conhecimento pessoal permite que um indivíduo hábil leia as interações e desejos de muitos outros indivíduos e, potencialmente, aja sobre este conhecimento.

Atualmente, Gardner considera a existência de uma oitava inteligência, a naturalista, que se refere à inteligência dos alunos que aprendem melhor pela natureza. Para esses alunos, a maioria do aprendizado precisa acontecer em locais abertos.

Inteligências múltiplas e Educação

Um tema central nessa abordagem é a importância das inteligências múltiplas utilizadas num encontro educacional. Este componente pode ser multiplicado, por exemplo, as capacidades usadas pelas inteligências podem ser usadas como um meio para adquirir informações. Assim, os indivíduos podem aprender pela exploração de códigos linguísticos, de demonstrações cinestésicas, espaciais ou de ligações interpessoais. Mesmo que várias inteligências possam ser exploradas como meio de transmissão, o próprio material a ser dominado pode incidir justamente no domínio de uma inteligência específica. Se alguém aprende a tocar um instrumento, o conhecimento a ser adquirido é musical. Se alguém aprende a calcular, o conhecimento a ser adquirido é lógico-matemático. E, assim, vem a ocorrer que nossas várias competências intelectuais podem tanto servir como meio quanto como mensagem, forma e conteúdo.

Os tipos de inteligência que são altamente valorizados diferem marcantemente nos contextos distintos de aprendizagem. Nas sociedades não-alfabetizadas, há uma elevada valorização do conhecimento interpessoal. Formas espaciais e corporais de conhecimento tendem a ser pesadamente exploradas, embora formas linguísticas e musicais possam também estar acima da média em determinadas circunstâncias específicas. Já em cenários educacionais modernos, o conhecimento lógico-matemático está acima, e determinadas formas de competência linguística são também valiosas; em contraste, o papel do conhecimento interpessoal é, em geral, reduzido, mesmo que formas interpessoais de conhecimento possam ser muito maiores.

Ao aplicarmos a teoria de Gardner na sala de aula, devemos organizar o currículo ao redor das sete capacidades da inteligência apontadas por ele. Contudo, devemos lembrar que o simples fato de um aluno frequentar aulas de música não faz com que ele desenvolva competências musicais. Para tanto, é necessário que o aluno compreenda aquilo que faz diante de situações desafiadoras que levem à resolução de problemas referentes à música.

Desse modo, Gardner estimula a criação de novos ambientes educacionais propícios ao desenvolvimento das habilidades cognitivas a cada aluno. Da mesma forma, sugere aos educadores que repensem as práticas avaliativas de modo a contemplar as competências já desenvolvidas pelos alunos, não privilegiando apenas uma forma de raciocínio, mas abrindo espaço para a utilização de modelos pedagógicos que privilegiam as avaliações processuais e diferenciadas.

Assim, podemos dizer que, atualmente, é fundamental para qualquer processo educacional que se ampliem as discussões em torno da teoria de Gardner, uma vez que traz para o campo pedagógico uma nova maneira de pensar e fazer Educação.

Texto: Valéria da Hora Bessa 
Fragmento do Livro: Teorias da Aprendizagem


Nenhum comentário:

Postar um comentário