No processo de aprendizagem é necessário que
a criança esteja motivada para que se interesse por uma atividade. E essa
motivação influencia no seu processo de aprendizagem e na construção de idéias
e convicções próprias, fazendo parte integrante de sua personalidade.
De acordo com Friedmann,
a aprendizagem depende em grande parte da motivação: as necessidades e os interesses da criança são mais importantes que qualquer outra razão para que ela se ligue a uma atividade e da confiança na sua capacidade de construir uma idéia própria sobre as coisas, assim como exprimir seu pensamento com convicção são características que fazem parte da personalidade integral da criança. (FRIEDMANN, l996, p. 42).
Dessa forma, o
brincar aparece como um elemento de aprendizagem e desenvolvimento de adaptação
social, de libertação pessoal e conservação da própria cultura ao encerrar uma
série de valores, nomeadamente recreativos, pedagógicos, culturais, entre
outros. Vale ressaltar que o brincar aparece também definido como jogo na
teoria piagetiana. Assim, ao longo do período infantil, Piaget observou três
sucessivos sistemas de jogo: o jogo de exercício, o jogo simbólico e o jogo de
regras.
O jogo de exercício está muito presente no
estágio sensório-motor e refere-se ao movimento corporal sem verbalização;
consiste simplesmente em utilizar para o prazer uma conduta qualquer, onde a
brincadeira é individual e autocentrada. Isso pode ser observado em bebês que
ficam repetindo gestos já aprendidos, em situações em que seu uso não é
necessário, por puro prazer, circunscrevendo a ação ao ato corporal.
Com o surgimento da linguagem, inicia-se o
processo que leva a criança em direção ao estágio pré-operatório, que incorpora
o anterior e acrescenta às atividades da criança os símbolos a representação
mental. Uma vez tendo acesso ao símbolo, a criança começa a representar suas
próprias ações. Temos com isso então o jogo simbólico; esse não tem limites
funcionais, além de exercer papel semelhante ao jogo de exercício, acrescenta
um espaço onde se podem resolver conflitos e realizar desejos que não foram
possíveis em situações não-lúdicas. É a fase do faz-de-conta.
O jogo de regras, por sua vez, marca a
transição da atividade individual para a socializada. Este jogo não ocorre
antes de quatro a sete anos, mas predomina no período de sete a onze anos. Para
Piaget, a regra pressupõe a união de dois indivíduos e sua função é regular e
integrar o grupo social. Podemos distinguir dois tipos de regras: as que vêm de
fora e as que são construídas espontaneamente, que dão origem ao jogo de
construção, onde a criança cria algo.
No que se refere aos aspectos sociais, os
jogos aparecem como instituições sociais capazes de promover a comunicação
interpessoal, criando um relacionamento grupal entre aqueles que jogam. Ou
seja, jogando, a criança tem acesso à realidade social e à compreensão das
regras. Desta forma, Piaget considera a atividade lúdica como berço obrigatório
das atividades intelectuais da criança, sendo, por isso, indispensável à
prática educativa.
O
brincar como instância educativa
O jogo ou brincadeira facilita a apreensão da
realidade e é muito mais um processo do que um produto. Por meio dele, a
criança percebe como se dá a relação humana, explora, desenvolve noções sobre o
número físico, estabelecendo novas cadeias de significado e amplia suas
percepções do real. Por ser essencialmente dinâmico, o jogo permite
comportamentos espontâneos e improvisados, uma vez que os padrões de desempenho
e as normas podem ser criados pelos participantes. Há liberdade para tomada de
decisões, e a direção que o jogo assume é determinada pelas crianças
considerando o grupo e o contexto.
Por meio da brincadeira, a criança
experimenta, se organiza, constrói normas para si e para o outro, cria e recria
o mundo que a cerca. Esta é a forma de linguagem que cada criança usa para
compreender e interagir com o mundo, estimulando a ludicidade e contribuindo
para uma série de fatores importantes para seu desenvolvimento físico,
emocional, cognitivo e social.
O desenvolvimento
social e a construção do juízo moral
Desta forma, é preciso, no interior dos
espaços escolares, valorizar a brincadeira como forma de expressão que traduza
a construção dos conhecimentos pela criança, vivenciada pela turma, em grupos
ou individualmente. Isso requer tempo e espaço, mas garante à criança o direito
à infância.
A importância
do brincar na educação infantil
Como vimos, pelo brincar a criança prepara-se
para aprender. Brincando ela aprende novos conceitos, adquire informações e
interage com o mundo. O brincar torna-se um elemento muito importante para o
desenvolvimento da criança, sendo um modelo ativo e formador de sua imaginação.
Segundo Moyles (2002, p. 62),
o brincar é tão importante para a criança como o trabalhar para o adulto. Isso explica por que encontramos tanta dedicação da criança em relação ao brincar. Brincando ela imita gestos e atitudes do mundo adulto, descobre o mundo, vivencia leis, regras, experimenta sensações.
Assim, temos que a brincadeira é uma forma de
linguagem que a criança utiliza para tentar compreender o mundo; brincando ela
recria os momentos de sua vida, suas experiências e suas expectativas. Enquanto
brinca, a criança percebe o outro e aprende que não está sozinha no mundo. O
brincar surge então como o espaço da partilha, da cooperação e também da
competição, atitudes que surgem e são negociadas naturalmente durante a
atividade lúdica.
Ao brincar, afeto, motricidade, linguagem e outras funções cognitivas estão profundamente interligadas. A brincadeira favorece o equilíbrio afetivo da criança e contribui para o processo de apropriação de signos sociais. Cria condições para uma transformação significativa da consciência infantil, por exigir das crianças formas mais complexas de relacionamento com o mundo (OLIVEIRA, 2002, p. l60).
É no momento que a criança deixa de brincar
sozinha e passa a perceber o prazer e a interação com o outro que desenvolve
também o afeto. O afeto representa a “mola propulsora” de toda e qualquer
atividade, o que significa dizer que o afeto contribui para que a criança
sinta-se atraída para a aprendizagem. Segundo Sá (2001, p. 99), os aspectos
afetivos, cognitivos e sociais são indissociáveis. A principal ferramenta
utilizada pelo homem na demonstração de afeto é a linguagem. Também é pela
linguagem que a criança se vê inserida no meio em que vive. Podemos perceber que
no momento que a criança vê a possibilidade de usar a linguagem como modelo de
interação na sociedade em que convive, ela inicia a utilização da linguagem
como instrumento de internalização dos papéis sociais, tanto que nas
brincadeiras de faz-de-conta interpreta as falas das pessoas de seu convívio.
Deste modo, as brincadeiras permitem a
exploração do potencial criativo de numa sequência de ações libertas e naturais
em que a imaginação se apresenta como atração principal, o que significa dizer
que por meio do brinquedo, a criança reinventa o mundo e libera as suas
fantasias.
De acordo com o Referencial Curricular
Nacional para Educação Infantil – Recnei – (BRASIL, l998), para que as crianças
possam exercer sua capacidade de criar é imprescindível que haja riqueza e
diversidade nas experiências que lhe são oferecidas. Para o Recnei (BRASIL,
l998):
[...] o brincar apresenta-se por meio de várias categorias de experiências que são diferenciadas pelo uso do material ou dos recursos predominantes implicados. Essas categorias de experiências podem ser agrupadas em três modalidades básicas e propiciam a ampliação dos conhecimentos infantis por meio da atividade lúdica.
Deste modo, percebe-se que o brincar é
considerado como uma atividade específica e fundamental na Educação Infantil. E
é este pressuposto que nos permite estabelecer a relação da brincadeira
infantil com a função pedagógica.
Texto:
Valéria da Hora Bessa
Fragmento
do Livro: Teorias da Aprendizagem
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