sábado, 18 de abril de 2015

Teorias da Aprendizagem XV As hipóteses infantis no processo de leitura


De acordo com as pesquisas de Emília Ferreiro, toda criança passa, ao iniciar seu processo de leitura, por cinco fases de desenvolvimento nas quais constrói hipóteses diferenciadas sobre a leitura e a escrita. Vejamos as características de cada fase.

Fase das garatujas: Diz respeito aos rabiscos realizados pelas crianças. Muitas vezes, tais rabiscos ainda não se configuram nem como desenhos, nem como palavras, mas têm para a criança uma representação específica do que ela pretende demonstrar. As garatujas são, desta forma, tentativas das crianças em representar os símbolos gráficos com os quais têm contato cotidianamente. O interessante dessa fase é que a criança, por não saber ler formalmente, representa no rabisco as suas próprias intenções e idéias de forma única, não havendo possibilidade de o mesmo rabisco ser compreendido de igual maneira por outro “leitor”, infantil ou adulto. Assim, segundo Ferreiro, a criança nesta fase é capaz de  interpretar o desenho, diferenciando-o da escrita;  utilizar algumas letras na tentativa de formar palavras;  reproduzir alguns traços da escrita.

Fase da hipótese pré-silábica: A criança, apesar de conseguir representar graficamente algumas letras e conhecê-las, ainda não é capaz de associar a letra à sua sonoridade. Justamente por isso, ao tentar representar algum objeto na forma escrita, o faz sem correspondência entre as letras e demais representações utilizadas e a palavra que deseja representar.

Fase da hipótese silábica: Nesta fase, a criança tenta mais amplamente reproduzir graficamente a letra a partir da associação da grafia com o som a ela associado. Deste modo, a criança busca associar o som à palavra, formando a hipótese de que é preciso usar formas diferentes para ler coisas diferentes. Para tanto, utiliza dois princípios básicos: o da quantidade de sílabas identificadas sonoramente na palavra e o da variedade de letras, uma vez que, para as crianças, elas não podem ser repetidas.

Fase da hipótese silábica alfabética: Nesta fase, instala-se o conflito entre o som e o número de sílabas representado. Isto significa dizer, de acordo com Rodrigues e Pariz (1998), que a criança representa o número de sílabas, mas percebe que para o som poder ser representado graficamente é preciso acrescentar mais letras. A criança – que até então entendia que o número mínimo de letras a ser utilizado numa palavra correspondia a três, sem que essas pudessem se repetir – é forçada a ampliar suas noções silábicas, o que a conduz para o nível seguinte.

Fase da hipótese alfabética: Nesta fase, uma vez tendo sido forçada pelo conflito da fase anterior a ampliar suas noções silábicas, a criança passa a representar a grafia e o som de forma correspondente, compreendendo que cada letra é um valor menor que a própria sílaba e que a sílaba é um valor menor que a palavra. Com isso, a criança passa a conseguir formar várias sílabas e, a partir das sílabas, palavras. De acordo com Ferreiro, podemos afirmar que as crianças nesta fase compreendem que  as letras são unidades menores que as sílabas e que estas últimas podem ser separadas nessas unidades menores; a palavra tem relação com o som, mas que o som não identifica necessariamente a letra que deve ser utilizada para que se possa grafar uma palavra e que, com isso, a escrita pressupõe uma necessidade de analisar foneticamente cada uma das palavras a serem representadas.

A alfabetização

Emília Ferreiro, seguindo os passos e orientações de Jean Piaget, buscou compreender de que maneira construímos conhecimentos em torno dos atos de ler e escrever. Para tanto, não buscou suas respostas nos modelos pedagógicos de ensino, mas sim nas próprias crianças que, por serem ativas em suas ações de conhecer, constroem elas mesmas suas próprias hipóteses sobre a leitura e a escrita. Por este motivo, Ferreiro não se preocupou em escrever sobre como ensinar uma criança a ler e a escrever, como muitos ainda pensam.

As ferramentas de análise dos processos de leitura e escrita utilizadas por Emília Ferreiro pautam-se nos princípios construtivistas de ação que na prática alfabetizadora podem ser utilizados como referência para todos os professores interessados em desenvolver seus alunos de forma ativa a partir de interações com a palavra.

Isto significa dizer que não é o professor que ensina o aluno a ler, mas sim que o próprio aluno, mesmo antes de adentrar a classe de alfabetização, já inicia um processo de leitura que costuma ser desconsiderado por muitos educadores. Neste sentido, uma vez que o aluno já traz para a sala de aula sua maneira de “ler” o mundo e representá-lo, o processo desloca-se do ato de ensinar para o ato de aprender – que depende da ação concreta do aprendiz sobre aquilo que deseja conhecer. Deste modo, o aluno deixa de ser um mero reprodutor de ideias já prontas e passa ser visto como um agente da sua própria aprendizagem.

Deste modo, ao ser apropriada pela Educação, a teoria desenvolvida por Emília Ferreiro contribui no sentido de buscar alterar as práticas alfabetizadoras até então deslocadas da criança, passando a considerá-la o centro de todo o processo educativo. Com isso, modifica-se também o olhar sobre o contexto social da criança, sua linguagem e suas maneiras próprias de intervir sobre a língua materna.

Texto: Valéria da Hora Bessa 
Fragmento do Livro: Teorias da Aprendizagem
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