O estudo do uso de instrumentos isolados do uso de signos é habitual nas
pesquisas a respeito da história natural do intelecto prático e nos estudos do
desenvolvimento dos processos simbólicos na criança. Os psicólogos preferiram
estudar o desenvolvimento do uso de signos como um exemplo de intelecto puro, e
não como o produto da história do desenvolvimento da criança. Como afirmava
W. Stern, o reconhecimento do fato
de que esses signos verbais têm significado constitui “a maior descoberta da
vida da criança”, atribuindo o uso desses signos à descoberta espontânea.
Um exame detalhado do
desenvolvimento da fala e de outras formas de uso de signos era considerado
desnecessário. Em vez disso, tem-se admitido que a mente da criança contém
todos os estágios do futuro desenvolvimento intelectual; eles existem já na sua
forma completa, esperando o momento adequado para emergir. Mesmo quando o uso
de instrumentos e a fala estavam intimamente ligados, eles eram estudados como
processos separados e pertencentes a duas classes completamente diferentes de
fenômenos.
Embora a inteligência prática e o
uso de signos possam operar independentemente em crianças pequenas, a unidade
dialética desses sistemas no adulto constitui a verdadeira essência no
comportamento humano complexo. Para Vygotsky, a atividade simbólica tem uma
função organizadora específica que invade o processo do uso de instrumento e
produz formas fundamentalmente novas de comportamento.
O momento de maior significado no
curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas
de inteligência prática e abstrata, acontece quando a fala e a atividade
prática, então duas linhas completamente independentes de desenvolvimento,
convergem. Assim que a fala e o uso de símbolos são incorporados a qualquer
ação, esta se transforma e se organiza dentro de linhas inteiramente novas.
Realiza-se, assim, o uso de instrumentos especificamente humanos, indo além do
uso possível de instrumentos mais limitados pelos animais superiores. A criação
dessas formas caracteristicamente humanas de comportamento produz, mais tarde,
o intelecto, e constitui a base do trabalho produtivo: a forma especificamente
humana de uso de instrumentos.
Os experimentos
realizados por Vygotsky demonstraram dois fatos importantes:
·
A fala da
criança é tão importante quanto a ação para atingir um objetivo. As
crianças não ficam simplesmente falando o que elas estão fazendo; sua fala e
ação fazem parte de uma mesma função psicológica complexa, dirigida para a
solução do problema em questão.
·
Quanto
mais complexa a ação exigida pela situação e menos direta a solução, maior a
importância que a fala adquire na operação como um todo. Às vezes, se não
for permitido seu uso, as crianças pequenas não são capazes de resolver a
situação.
Essas observações nos levam a
concluir que as crianças resolvem suas tarefas práticas com a ajuda da fala,
assim como dos olhos e das mãos. Essa unidade de percepção, fala e ação, que,
em última instância provoca a internalização do campo visual, constitui o
objeto central de qualquer análise da origem das formas caracteristicamente
humanas de comportamento.
Para desenvolver o primeiro desses pontos devemos indagar: o que realmente
distingue as ações de uma criança que fala das ações de um macaco na solução de
problemas práticos?
A primeira coisa que impressiona é a
liberdade incomparavelmente maior das operações das crianças, a sua maior
independência em relação à estrutura da situação visual concreta. As crianças,
com a ajuda da fala, criam mais possibilidades que aquelas que os macacos podem
realizar com a ação. Em segundo lugar, as operações práticas de uma criança que
pode falar tornam-se muito menos impulsivas e espontâneas do que as dos
macacos. Esses, tipicamente realizam uma série de tentativas descontroladas de
resolver o problema em questão. Diferentemente, a criança que usa a fala divide
a atividade em duas partes consecutivas. Por meio da fala, ela planeja como
solucionar o problema e então executa a solução elaborada por uma atividade
visível. A manipulação direta é substituída por um processo psicológico
complexo por meio do qual a motivação interior e as intenções, postergadas no
tempo, estimulam o seu próprio desenvolvimento e realização. Essa forma nova de
estrutura psicológica não existe nos macacos.
A maior mudança na capacidade das
crianças para usar a linguagem como instrumento para a solução de problemas
acontece um pouco mais tarde no seu desenvolvimento, no momento em que a fala
socializada (que foi previamente utilizada para dirigir-se a um adulto) é
internalizada. Em vez de apelar para um adulto, as crianças passam a apelar a
si mesmas; a linguagem passa, assim, a adquirir uma função intrapessoal além do
seu uso interpessoal. A relação entre fala e ação é dinâmica no decorrer do
desenvolvimento das crianças.
Num primeiro
estágio a fala acompanha as ações e reflete as vicissitudes do processo de
solução do problema de uma forma dispersa e caótica. Num estágio posterior, a
fala desloca-se cada vez mais em direção ao início desse processo, de modo a,
com o tempo, preceder a ação. Concebe-se assim, a atividade intelectual verbal
como uma série de estágios nos quais as funções emocionais e comunicativas da
fala são ampliadas pelo acréscimo da função planejadora. Essa estrutura humana
complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado
nas ligações entre história individual e história social.
O papel
do professor no desenvolvimento do pensamento e da linguagem
De acordo com a teoria de Vygotsky, o domínio
da linguagem (oral e escrita) é fundamental para o desenvolvimento cultural do
aluno, evidenciando sua presença no mundo e a possibilidade de intervir no seu
ambiente.
Por esse motivo, o professor deve acompanhar
o modo pelo qual a criança internaliza o conhecimento externo e como o
aprendizado escolar incita as relações internas dos processos intelectuais.
Assim, ele assume um papel de intermediação no processo de aprendizagem do
aluno e o ajuda a construir seu conhecimento. Também é igualmente importante atentar para o meio cultural no qual os
alunos estão inseridos, uma vez que os mesmos podem apresentar rendimentos
desiguais do nível de habilidades e conhecimentos.
Com isso, chamamos a atenção dos educadores
para que, antes de iniciar processos de aprendizagem tentem conhecer o universo
sociocultural e vocabular de seus alunos, percebendo se estão aptos a
compreender a linguagem que será utilizada em sala de aula.
Texto:
Valéria da Hora Bessa
Fragmento
do Livro: Teorias da Aprendizagem
Nenhum comentário:
Postar um comentário